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Rememorar

A consideração ao contexto do ambiente é o tema deste cordel escrito por Chelmí Jep

O trabalho com arte e cultura em entidades socioeducativas requer respeito a certas regras veladas de convivência. Josefina, depois de alguns anos trabalhando em entidades masculinas, onde só podia cumprimentar os alunos com aperto de mão, precisou se adaptar às unidades femininas, com mais proximidade para abraçar as alunas e gerando um vínculo emocional maior.

 

O grupo dela era bem engajado e gostava de participar das aulas de canto coral, até que um dia Josefina percebeu que as alunas estavam bem arrumadas, com os cabelos bem cortados. Entretanto, não queriam participar da aula, pois estavam muito tristes. Ela insistiu, perguntou o porquê daquela situação, mas não conseguiu resposta. Para aumentar a tensão, sua coordenadora foi assistir a aula neste dia. A professora ficou preocupada com o que iam pensar sobre aquela situação e também queria mostrar um pouco do que estava sendo desenvolvido. 

 

Josefina se frustrou e não conseguiu mostrar o trabalho como queria, ainda sem entender porque as alunas estavam tão bem arrumadas. Ela deveria ter repreendido o grupo ou interrompido o ensaio? O fato de a professora estar sendo observada pesou no trabalho com a turma? O que será que estava acontecendo com as meninas?

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Aqui começa a rima

Que até parece hino

Pra mudar o clima 

Com verso genuíno

Sextilha é a matéria-prima

Brotando sonho de menina e de menino

 

Então, bora pra essa história

Que Josefina protagoniza

Recriando nova memória

A dor até que ameniza

Cada dia é de glória

Mas nem tudo se eterniza

 

Ela trampava em centros masculinos

Imaginem só

Também foi chamada pra centros femininos

E não achou um ó

Pois sonhos grandes e pequeninos

São tão lindos como canela de socó

 

Com os manos nem tudo era disforme

De cabelo e tamanho diferente

Josefina vestia seu uniforme

Dia triste e dia sorridente

Tentava deixar tudo nos conforme

 

Pra fortalecer a mente

Com as meninas ficou à vontade

Brincava, abraçava e beijava

Ali não viu maldade 

Nunca esbravejava

Uma potência de verdade

Que Josefina adorava

 

Baita turma criativa

Cheia de esperança

Cada menina proativa

Ceis têm que vê que bela andança

Todas com voz ativa 

Pra ser guardada na lembrança

 

Ela, nova na entidade

Quis divulgar o Canto e Coral

Pra gente de toda idade

Somando em alto astral

Com a turma de dança, sem vaidade

Propôs um ensaio na moral

 

No dia do ensaio, vejam o que aconteceu

Cabelo cortado, trançado e unha pintada

A meninada na estica, assim compareceu

Sem visão precipitada 

A novidade ali permaneceu

Igual comida temperada sem pitada

 

Mariza, a coordenadora acompanhou

Fizeram aquecimento

Mas a coisa não deslanchou

Mesmo depois do alongamento

Nenhuma flor desabrochou

Deixando Josefina cheia de pensamento

 

Tinha tristeza pairando no ar

E Josefina tentando entender

Um monte não quis participar

Difícil compreender

O mundo continuou a girar

Pro tempo não se perder

 

O que há de errado?

Josefina perguntou

Com o semblante mal-humorado

A roda não firmou

Num dia ensolarado

O clima não esquentou

 

No meio disso tudo

A moçada da dança mandou ver

Naquele ambiente mudo

O corpo passou a mexer

Em meio a olhares com escudo

Ali tinham que viver

 

Josefina perdeu a calma

Aí sim passou a bravejar

Mesmo tendo boa alma

E com seus olhos prestes a marejar

Cena sem palma

E a coordenadora lá sem pestanejar

 

Duas horas de ensaio

Um arrasto tremendo

Quase houve desmaio

E o pensamento retorcendo

Frustração que não cabia em balaio

E Josefina quase morrendo

 

Algumas horas adiante

Josefina se tocou

Dia das Mães é diamante

E no dia anterior ninguém as visitou

Nada poderia ser mais entediante

Não vendo suas mães ou os filhos que gerou 

 

Neste dia houve um grande aprendizado

Josefina se tornou mais sensível

Dispensou o olha enviesado

Pra mudar de nível

Pois nem tudo que é enraizado

É sempre incrível.

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Para refletir

Este cordel mostra a diferença entre as realidades do trabalho com coros masculinos e femininos. A história levanta algumas reflexões sobre a necessidade de uma regente aprender a lidar com grupos diversos. Provoca, ainda, uma outra questão: Num trabalho coral, o que merece ser mais valorizado, processos ou resultados? A professora Josefina também precisou lidar com a relação entre gêneros com o novo grupo. Como lidar com as possibilidades de o quanto o toque físico pode influenciar o ensaio do coro?

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  1. A regente tinha um modo de trabalho com coros masculinos e se deparou com outra realidade no grupo feminino. A possibilidade de contato físico pode fazer diferença no ensaio do coro? Como encontrar os limites dessa prática?

  2. Como você agiria diante da falta de participação das alunas? Repreensão? Outro repertório? Cancelamento do ensaio?

Você pode ouvir este cordel

Para saber mais

O jovem em cumprimento de medida socioeducativa e a família

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